A Covid 19 colocou na agenda das empresas o teletrabalho. E a discussão começa a polarizar-se: de um lado os que receiam que resulte numa perda de controlo, desorganização e baixa de produtividade das empresas; do outro, os que suspeitam que no final são as pessoas que ficam a perder, porque vão trabalhar mais e deixar de ter vida pessoal. Um debate mais emocional do que racional e que apenas contribui para atrasar a adesão a um conceito pleno de potencial para criar valor para as empresas e para as pessoas. Porque ambas ganham: as empresas, porque reduzem despesas com instalações; as pessoas, porque ganham tempo e reduzem custos com deslocações, entre outras.
O teletrabalho é por isso inevitável. E a questão não é decidir entre aderir ou não aderir, mas sim como aderir. Uma pergunta cuja resposta passa por implementar um sistema de teletrabalho que desencadeie e sustente estados psicológicos positivos nos teletrabalhadores através do próprio teletrabalho. Dito de outra forma: fazer com que as pessoas se sintam bem por desempenharem a sua função nesta modalidade de trabalho. E como? Através da organização do posto de trabalho, de modo a que os teletrabalhadores vivenciem uma experiência com significado (sentirem que faz sentido fazerem o que fazem e como fazem), percecionem um sentimento positivo de achievement (gerarem fluxos de energia motivacional capazes de os levar a superar os desafios necessários à concretização de conquistas profissionais que valorizam) e visualizem o contributo do trabalho que executam para os resultados da empresa (ficarem satisfeitos por saberem que o que fazem impacta no desempenho do departamento e da empresa como um todo).
E como gerar estados psicológicos positivos nos teletrabalhadores? O segredo está na criação de condições para que estes três processos psicológicos (experiência, achievement e contributo) sejam ativados com a realização do trabalho em regime de teletrabalho. Para tal é necessário ajustar a variedade, a identidade e o significado dos skills requeridos no desempenho da função (por exemplo, uma pessoa que se sente mais confortável a executar tarefas muito variadas dificilmente vai gostar de desempenhar uma função cujas tarefas são muito similares umas às outras). Adicionalmente, é importante que o grau de autonomia exigida pela função seja compatível com a capacidade e o desejo do teletrabalhador neste domínio (por exemplo, uma pessoa que tenha dificuldades em tomar decisões, dificilmente vai gostar de executar uma função que exige tomada de decisão e assunção de responsabilidades sem o apoio de uma hierarquia ou de um colega). Por fim, é desejável que seja dado feedback ao teletrabalhador sobre como está a desempenhar a sua função e os resultados que está a alcançar com o que faz (por exemplo, se uma pessoa precisa e gosta de saber se o que faz e concretiza é o que a empresa pretende e valoriza, mas isso não lhe é dito, aumenta de forma significativa a probabilidade de vir a vivenciar estados de ambiguidade que resultam em ansiedade, com impacto negativo no seu bem estar psicológico e na sua capacidade de trabalho).
O teletrabalho é exequível e fonte de valor. Não substitui, mas vai “conquistar” terreno ao modelo tradicional de organização do trabalho. Mais, vai alterar o quadro legal que rege as relações laborais, os modelos de organização e funcionamento das empresas e a própria sociedade. A questão não está por isso entre aderir ou não aderir ao teletrabalho, mas sim em desenhar e implementar o modelo de teletrabalho que é mais adequado e eficaz em cada empresa, tendo em conta os modelos de negócio e de organização, mas também de geração de experiências de trabalho que atraiam e retenham os melhores profissionais. E, conforme referido, nesse processo é crítica a geração e a manutenção de estados psicológicos positivos nos teletrabalhadores através do próprio teletrabalho.
José Duarte Dias
Managing Partner
Paradoxo Humano